Duas são propostas do Presidente Eleito na área do trabalho.
 
Primeiro, Jair Bolsonaro quer estender a todos os trabalhadores o que a reforma trabalhista abriu para os profissionais de altos salários e nível universitário, ou seja, a negociação ampla, individual e direta entre empregados e empregadores. 
 
A princípio, pensei que ele se referia apenas à negociação dos direitos constantes da CLT. Mas, na semana passada, ele incluiu também direitos constantes do artigo 7º. da Constituição Federal. Para Bolsonaro, esse artigo pode e deve ser revisto pelo Congresso Nacional para flexibilizar certos direitos que no mundo inteiro constam em leis ordinárias ou em contratos coletivos (ex: valor da hora extra, extensão da jornada de trabalho, trabalho aos domingos, etc.). Tal revisão visaria ajustar as regras trabalhistas à crescente heterogeneidade do mercado de trabalho moderno.
 
Muitos argumentam que a negociação individual entre empregados e empregadores dificulta a administração do pessoal, em especial, nas grandes empresas, pois cada empregado teria seu próprio pleito, criando, assim uma verdadeira balbúrdia para os profissionais de recursos humanos. Isso realmente preocupa, pois, afinal, a negociação coletiva estabelece regras gerais para todo o quadro de pessoal. 
 
Mas darei, aqui, uma de futurista. Penso que dentro de poucos anos empregados e empregadores acertarão as condições de trabalho de modo direto e pela via das novas tecnologias de comunicação (e-mail, WhatsApp, etc.), dispensando, assim, os negociadores e a própria negociação coletiva. Tudo será mais fácil, mais direto e mais rápido. Afinal, o próprio Bolsonaro conquistou seus votos por meio do telefone celular, dispensando marqueteiros e comícios presenciais.   
 
A outra proposta visa instituir um regime de liberdade sindical para acabar com a reserva de mercado garantida pelo artigo 8º. da Constituição Federal que veda expressamente a criação de mais de um sindicato por categoria e base territorial. 
 
Revogado esse artigo, empregados e empregadores poderão criar sindicatos representativos com base em qualquer critério. Surgirão sindicatos que concentram e outros que desconcentram profissionais – semelhantes ou diferentes. Por exemplo, no setor bancário, poderá ser criado um sindicato concentrado englobando bancários, transportadores de valores, funcionários de call centers e pessoal de limpeza e conservação. Ou sindicatos desconcentrados representando profissões como, por exemplo, um sindicato de caixas, outro de tesoureiros, de gerentes de agencias e assim por diante. 
 
Isso muda bastante o poder dos atores nas negociações coletivas. Acaba o monopólio dos sindicatos atuais. Surgem novos credenciados. Muitos, até então desconhecidos. O mesmo pode ocorrer do lado patronal. 
Até que ponto os empregados e os empregadores estão preparados para esse novo jogo? O que ocorrerá quando dois ou três sindicatos representativos pleitearem o direito de negociar? Como lidar com sindicatos que englobam setores econômicos diferentes? 
 
Esses desafios não são insolúveis. Mas, será necessário definir regras claras para disciplinar a negociação coletiva e para garantir um mínimo de previsibilidade para os agentes econômicos. Nos países avançados, essas regras foram definidas por lei ou por pactos sociais. O mesmo terá de ser feito entre nós.  
 
Mas, se o mundo do trabalho intensificar as comunicações diretas entre empregados e empregadores, dispensando sindicatos, esta reforma terá curto prazo de validade.
 
José Pastore 
*Professor da Universidade de São Paulo, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras
 
 
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