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Olavo Romano
 
Para a festa dos noventa anos de doutor Fábio Chaves vieram convidados de todo canto. Pessoas que há muito não se viam aproveitavam para trocar informações, saciar curiosidades, admirar-se com a beleza dos jovens, falar da saúde uns dos outros, rememorar velhos tempos.
Kátia arrumou nosso quarto com carinho, feliz por cedê-lo aos tios Teresinha e Nazareno, retribuindo um pouco das muitas gentilezas recebidas desde a infância. Da tia, exímia costureira, também famosa por seus quitutes e iguarias, lembra o caso do vestido, que não é o de Drummond, de quem tio Nazareno (Drummond Martins da Costa) é orgulhoso parente. Discutindo o modelo com que tanto sonhava, a vaidosa sobrinha explicou: “Quero um punho duplo, assim”. E mostrou com a mão fazendo uma curva abaixo do pescoço. Para ajustar gesto e palavra, evitando enganos no feitio, tia Terezinha exigiu: “Desenha, Kátia!”. 
Depois da festa, feitos os comentários de praxe sobre o estado das pessoas, quem emagreceu, engordou, envelheceu ou surpreendeu pela boa aparência; repassadas cenas, conversas, evocações, chegamos ao mundo presente, com notícia de filhos e netos, dos parentes que não puderam vir, trabalhos, sucessos e desafios, peripécias da vida, do amor, da saúde e do dinheiro. 
Tio Nazareno abriu velhos baús itabiranos, evocou o casarão da família, cujo inventário já poderia ter-lhe dado boa folga financeira não fossem tão perversamente morosos os labirintos da justiça. Contou episódios de sua longa vida, das variadas atividades, do bom emprego no Banco do Brasil que não teve sofrimento de manter. Fez a indispensável parada na família e na figura de Drummond, presenteou-me com lindo livro de capa preta sobre o Poeta. Falou de sua atual labuta na fazenda triangulina, vagarosos dias de semana passados na paz, na modorra e no silêncio, às vezes rompidos por inesperados apertos e perigos. 
Como no dia em que escapou de despencar no fundo da cisterna apoiando os braços na beira do poço. Depois de horas de um tempo congelado entre o medo e a esperança, restou-lhe uma permanente dor nos ombros, pelo rompimento de tendões forçados além do limite. Esgotado o repertório de variedades, ficamos de bobeira, conversando, contando caso, inventando papeatas, rindo de qualquer coisa, como duas crianças de férias.
Cansada de tanta algazarra, tia Terezinha contou a história de um rapaz que, indo para o trabalho, passou por homem e um peru na beira da estrada. O homem assobiava, o peru fazia gluglu. De tardinha, os dois continuavam lá, exaustos. O sopro do homem era sem som, o peru mal balançava o pescoço. “Só que estes dois aí não param nunca”, lamentou-se, apontando para nós dois. 
Depois que eles se foram, dona Zilda, minha sogra, comentou: “Então quer dizer que vocês fizeram o Nazareno e a Teresinha dormirem juntos?”. Surpresos por jamais termos imaginado que tio Nazareno não aguentava dormir com alguém ao lado, e arrependidos pelo involuntário constrangimento que causamos, nos consolamos ao saber do comentário de tia Teresinha: “Até que não foi tão ruim”. 
 
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