Um começo que preocupa
Um começo que preocupa
Um começo que preocupa

Eleições democráticas costumam ser a melhor solução para se resolver impasses e conflitos políticos. Ocasionalmente, no entanto, elas podem ao contrário tornar os conflitos mais difíceis de serem resolvidos. Este é o caso do Brasil neste momento.

As eleições forem vencidas por uma diferença muito pequena, menos de dois milhões de votos num pleito ao qual compareceram 124 milhões de eleitores. Terminadas as eleições as paixões não se dissiparam e os ânimos permanecem acirrados. Não me lembro de haver presenciado nosso país dividido em metades aparentemente tão irreconciliáveis. Outras alternâncias de poder ocorreram depois da Constituição de 1988 e nenhuma delas se deu num ambiente de tanta raiva e tanta contestação.

Devemos ter a consciência de que vivemos em um país em crise profunda. Apesar das propagandas de todos os governos estamos há mais de 40 anos sem efetivo crescimento da economia, o contingente de pobres e de quase pobres não diminui na vida real e forma a maioria esmagadora do país, a infraestrutura criada no passado, com sacrifício e até com alguma irresponsabilidade, está sendo consumida sem reposição e o Estado vive em permanente penúria, com muita dívida e muito pouca ação. Um país nessas condições precisa de um governo fortemente apoiado e capaz de construir grandes consensos para enfrentar desafios que são tremendos.

Até nas guerras são os vencedores os que tomam a iniciativa de realizar a paz. Nas lutas políticas este imperativo é muito mais evidente, porque os vencidos não podem ser aniquilados fisicamente. O clima de conflito permanente torna a vitória precária e inútil, pois não há como governar uma nação sem uma grande dose de cooperação.

Baseado nessas verdades tão instintivas vejo os primeiros movimentos do novo Governo Lula com apreensão e temor. Qualquer análise que se faça do resultado eleitoral mostra que a vitória de Lula não foi uma vitória do seu partido, nem de sua coalizão partidária. Ninguém pode negar que a maioria dos seus votos realmente proveio deles, mas se não fossem acrescidos dos votos de eleitores independentes, cujo principal propósito era evitar a reeleição de Bolsonaro, Lula seria derrotado, como foi Haddad em 2018.

A complexidade da situação brasileira é tal que o governo Lula só terá possibilidade de êxito se puder contar com a concordância da grande maioria do país. Isto significa o apoio e a torcida de todos os vencedores mais uma boa parte dos que foram vencidos. Para isto seria necessário um governo cujas políticas fossem generosas e plurais e que fosse integrado na sua maioria por personalidades representativas da nação e reconhecidas como tal, pela competência e pelas virtudes morais.

Já empossado, os movimentos do novo governo não apontam para esta direção. Está sendo formado um governo que é a imagem do velho PT, com suas qualidades e seus defeitos. O Presidente Lula não recebeu este mandato do povo brasileiro. O PT teve um desempenho medíocre nas eleições para o Congresso e para os Governos estaduais, ao contrário da coalizão que apoiou Bolsonaro, que fez a maioria no Congresso e elegeu a maioria dos Governadores em todo o país.

Ao final, muitos partidos foram contemplados num Ministério que foi ampliado o quanto fosse necessário para abrigar todo o mundo. Serão, no entanto, pastas periféricas e sem autonomia porque o centro de decisão já está formado por companheiros fieis do PT e de siglas auxiliares. Nem a anunciada Frente Ampla está se concretizando, pois, seu lugar, se houver, será nas órbitas mais externas do Poder.

Parece que o novo governo não deseja, ou não consegue, representar as maiorias do país. O ano de 2023 está muito distante de 2003 e também muito diferente. A experiência daqueles tempos não serve aos desafios de hoje. A ideia de que será possível conquistar todo o país com a força de grandes resultados na economia e na vida das pessoas é uma ilusão e pode custar muito caro. Tomara que eu esteja errado.

*Advogado, ex-deputado federal, ex-ministro da Previdência

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