* Por Paulo Rabello de Castro

O governo entra na briga para chupar ainda mais as economias restantes do lado produtivo, no afã de fechar as contas balofas da previdência imprevidente. O resultado? Simples: o setor produtivo, que toca o País, encolherá mais e mais, querendo escapar da surra.

No momento atual, vamos combinar, esquerda e direita se odeiam de todo coração. Para a direita, os caras da esquerda destruíram o País; daí a dificuldade extrema de tirar a charanga econômica do atoleiro. Para o grupo simpático ao governo, essa tese ressoa como verdade absoluta. Na outra ponta, a esquerda sofre calada, cheia de vergonha até pelo que não fez, mas lá no fundo, se consola, no seu sonho mudo de vingança, com a ideia de que “esse País só cresceu e o povo só parou de sofrer quando estivemos lá; e é para lá que voltaremos”.

Exageros na política são tolerados. Desde que a fantasia não enterre os fatos da realidade. É o que mais acontece agora. Fatos se suicidam todos os dias. A fantasia reina. Direita e esquerda se aferram a teses delirantes para que suas próprias fantasias não desbotem, para que o ódio bem fermentado nos porões das fake news não pare de espumar e para que a propaganda da “verdade final” sobre o adversário, a ser massacrado, jamais ceda espaço à razão. Esse é o substrato do conflito brasileiro, que tem relação com o estancamento do País.

Comecemos pelo dogma da direita, aquele do País arrasado por Dilma, Lula e PT. Esse dogma sustenta a desculpa pela continuidade da estagnação brasileira, em 2019. A FGV acaba de soltar uma nova estimativa para o PIB deste ano, que não chega a 0,6%. Os últimos desempenhos mensais de vendas no varejo e da produção industrial são horrorosos. O desemprego campeia para todos os lados. E os filhos dos mais ricos fazem planos para sua auto-emigração. Num ambiente assim, o esperado seria que a gente agisse como na propaganda da televisão: corrermos todos para o posto Ipiranga, porque lá teríamos nossas respostas. Qual nada. Decorridos seis meses, a frustração de qualquer taxista, em qualquer cidade do País, é completa. O governo e seu super-ministro empurram a culpa para cima da demora na aprovação da única reforma (errada) que enviaram ao Congresso. Esqueceram de consultar o manual de economia e os dados da conjuntura para concluir que o estancamento nada tem a ver com votação alguma, mas com o remédio que a equipe elegeu para aplicar no lombo do burro. Na queda de braço entre empresas e famílias, de um lado, e o setor coercitivo, que é público e financeiro, do outro, cujos tentáculos hoje capturam mais da metade da energia produtiva do País, o governo entra na briga para chupar ainda mais as economias restantes do lado produtivo, no afã de fechar as contas balofas da previdência imprevidente. O resultado? Simples: o setor produtivo, que toca o País, encolherá mais e mais, querendo escapar da surra.

Os economistas chamam isso de “crowding out”, expressão em inglês que diz, mais ou menos, do poder dos governos em extrair recursos do bolso dos particulares, ocupando espaços e iniciativas destes, substituindo tudo que é mais produtivo pelo gasto estéril ou ocioso. No crowding out, se troca uma dúzia inteira por meia. É isso que o governo, dito liberal, tem se proposto a fazer, quando quer chupar mais R$1 trilhão dos que já contribuem para o INSS. Ao invés de propor cortes de gastos onde a gordura abunda, propõe arrecadar mais dos que já ralam para aumentar as receitas do governo. Essa joia de irracionalidade econômica, uma vez falada com ares de verdade, é repetida com audácia e estupidez por especialistas e comentaristas. O governo, para recuperar a economia, não teria que extrair, sacar, tirar de quem produz; pelo contrário, coibir o gastador que gasta a renda suada de terceiros! Simples assim. A atual reforma da previdência foi montada na lógica da extração do segurado que é contribuinte efetivo, enquanto o relator do substitutivo, um gênio da artimanha, aprimorou a insensatez ao excluir do sacrifício todo e qualquer grupo beneficiário, que mama recursos sem haver contribuído.

Mas a esquerda também espera sua vez de mostrar a resplandecente estultice, pois então haverá de provar ao País aquelas verdades finais de como o país só nasceu com Lula, que foi golpeado pelos traíras e que, agora, afunda pela aplicação do liberalismo na economia. Lula fez o país crescer, sim, embora sempre abaixo do seu potencial. Dilma aprimorou o consumo em sacrifício dos investimentos e deu no que deu. Desde então, nos afeiçoamos à recessão e o atual governo se esforça em fazer o melhor para extrair tudo que pode da produção sem bater de frente, uma única vez, contra as fontes criadoras do impasse recessivo. O “menos Brasília e mais Brasil” não passou de papo furado.

Mas tem jeito? Sim, nunca esteve tão próximo. Já vi um país em descontrole inflacionário. Já presenciei ministros sem saber como honrar um pagamento da dívida externa por falta do último tostão em dólares na reserva do Banco Central. Já fui brasileiro num país que virava o nariz para o interior e para a agricultura, que hoje é um dínamo a impedir que as cidades afundem na escassez de alimentos. Mal ou bem, a infraestrutura básica está ai. A indústria que resistiu, também. As universidades e os pesquisadores. Os empreendedores de todos os calibres. Muito pouco existia quando um Getúlio Vargas e um JK fizeram o País buscar o sonho de sua própria ocupação física e econômica. Antes, já foi muito mais difícil.

E hoje, o que é difícil? Vencer os ódios burros, é bem difícil. Colocar freio efetivo na gastança sem vergonha dos que mamam, está bem complicado. Colocar alguns dos gênios que nos governam e legislam para examinar os números antes de dizer bobagem, isso é quase impossível. Só por isso, temos uma crise resistente e um enorme desemprego. Que pena.

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