Política Monetária: As diferenças entre EUA e Brasil
Política Monetária: As diferenças entre EUA e Brasil
Política Monetária: As diferenças entre EUA e Brasil

Luis Paulo Rosenberg*

Nesta semana, o Ministro Guedes concedeu didáticas entrevistas, defendendo a tese de que avaliação da política econômica está sendo injustamente contaminada pelo rechaço generalizado às posições adotadas por Bolsonaro.

Cita a qualidade da execução orçamentária, em que receitas disparam e despesas permanecem sob controle, a excelência das contas externas e a retomada animadora do emprego e atividade econômica. Nem o esforço bem sucedido de avançar nas privatizações, concessões e reformas estruturais recebe aplausos dos formadores de opinião: o ambiente de disputa sucessória dividiu a sociedade entre bolsominions e o resto da sociedade, sufocando o respeito à lógica econômica.

O ponto que mais sublinhou foi o consenso pessimista quanto à inflação brasileira. Repudia a tese de que estamos em um processo descontrolado. E foi muito feliz ao convocar o exemplo americano, onde, como aqui, a inflação de 2021 estaria marchando para 8 por cento.  Para tanto, lembra que a pandemia gerou rupturas importantes nas cadeias produtivas, introduzindo pressões de custo introjetadas em todas as economias, agravadas pelo impacto do surto de preços de commodities. E endossou a tese de que não há tibieza da nossa Autoridade Monetária e sim uma mera politização da análise, que compromete uma avaliação objetiva da realidade.

Nesta coluna, temos defendido estes mesmos pontos, apesar de todo o desalento que sentimos, decorrente das agressões toscas do Presidente às instituições democráticas.

Mas algo passou batido no arrazoado de Guedes: a diferença radical de atitude do Fed e do nosso Banco Central perante as pressões de preço. Ora, se os dois processos, como o Ministro bem salientou, têm as mesmas causas e consequências, por que terapias opostas foram adotadas?

Nos Estados Unidos, o Fed esposou firmemente a tese de que choques de oferta não devem ser combatidas com elevação de juros, pois o resultado é o enfraquecimento do processo de recuperação econômica, em uma circunstância em que a própria operação da economia se encarrega de corrigir automaticamente a pressão, com mudanças de preços relativos e ajuste de poder aquisitivo. Como aqui, lá o mercado teve um episódio de desconforto e elevou os juros futuros, manifestando dúvidas se o Fed fazia o certo. O Fed enfrentou as pressões, sustentou sua posição, argumentou que estava atento e agiria a tempo. Já há algumas semanas, os índices de preços de commodities arrefeceram, confirmando o diagnóstico do Fed.

Como resultado, os mercados se acalmaram, os juros de 10 anos, que haviam alcançado 2 por cento ao ano regrediram a menos de 1,5 e a tranquilidade foi recomposta, sem elevação de juros curtos. Tudo isto, apesar de a economia americana estar bem mais aquecida do que a nossa, pois talvez a pressão de oferta estava sendo referendada também por um excesso de demanda privada e pelo impacto de um programa expansionista de investimento público em obras de infraestrutura.

E no Brasil?

Sem qualquer indício de aquecimento de demanda (pelo contrário, as projeções semanais de crescimento do PIB vêm sendo revisadas monotonicamente para baixo), o Banco Central colocou os juros numa trilha ascensional acelerada, em nome da ancoragem de expectativas. Às pressões internacionais de preços, tivemos aqui a adição da escassez de chuvas, elevação do preço de energia e subida do câmbio engendrada pela intranquilidade política. Agravantes da elevação de preços, sem dúvida, mas todas do lado oferta, situação em que a subida de juros impõe mais custos à atividade do que arrefecimento de preços. Ao contrário do Fed, aqui o Banco Central piscou, cedeu às pressões altistas do mercado e engajou-se em política que obstaculiza o crescimento da oferta e pressiona a execução fiscal com custos ascendentes de servir a dívida, em volume maior do que qualquer programa social.

Guedes passou lotado sobre esta divergência entre as posições dos gestores da política monetária nos Estados Unidos e no Brasil, limitando-se a pedir confiança na ação do Banco Central.

Perante o sucesso da atitude americana, focado mais nos mandamentos da boa Economia do que na submissão ao açodamento dos agentes de mercado, fica difícil aceitar a postura caudatária da nossa política monetária, cedendo às pressões altistas do mercado de juros, fazendo letra morta da lei recém aprovada que lhe deu independência, mas que também lhe atribuiu uma restrição adicional: levar em conta o impacto sobre a atividade econômica em suas decisões. (Fonte: Investing.com-25.08)

*Economista e consultor, com carreira destacada nas áreas acadêmica, empresarial e na atividade pública. PHD em economia pela Vanderbilt University, atuou como assessor do Ministro Delfim Neto, responsável pelos setores de Ciência, Tecnologia e Investimentos em Energia. Foi membro da equipe de negociação com o FMI, membro do Conselho de Administração da Cia. Suzano, Nestlé e Banco BBVA. Atualmente é sócio-diretor da Rosenberg Partners.

(Os artigos e comentários não representam, necessariamente, a opinião desta publicação; a responsabilidade é do autor do texto).

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