Luis Paulo Rosenberg

Economista e consultor, com carreira destacada nas áreas acadêmica, empresarial e na atividade pública. PHD em economia pela Vanderbilt University, atuou como assessor do Ministro Delfim Neto, responsável pelos setores de Ciência, Tecnologia e Investimentos em Energia.Foi membro da equipe de negociação com o FMI, membro do Conselho de Administração da Cia. Suzano, Nestlé e Banco BBVA. Atualmente é sócio-diretor da Rosenberg Partners.

O Brasil passa por um momento desanimador. No lado político, o despreparo do Presidente é fonte diária de desalento. O amadorismo ao lidar com a pandemia, a irritação internacional provocada pela sua postura ambiental, seu alinhamento incondicional à Trump, suas estocadas na China e a pífia taxa de aprovação de projetos importantes no Congresso são alguns marcos do primarismo de Jair Bolsonaro.
Claro, se as promessas de modernização da economia estivessem sendo cumpridas, a tolerância seria maior. Mas a gestão da economia está sob fogo intenso, pois reformas, como a tributária e a administrativa, sequer estão definitivamente formuladas. A perseguição dele a membros da equipe econômica já provocou a saída de meia dúzia de talentos de primeira linha e o abate continua. Muitos profetizam a queda do ministro Paulo Guedes para breve.
Mas é para a condução da política econômica que vão as críticas mais duras do mercado. Analistas vêm a questão fiscal como causa perdida, o que afugentará investidores: o déficit extrapolou e não há reversão à vista. Consequentemente, para eles, os juros estão abaixo do que deveriam estar e a disparada dos preços no atacado nos últimos meses comprova que a política monetária está desconectada da realidade. Concluem os críticos: inflação e recessão reluzem no horizonte, prometendo um 2021 desastroso.
Tente esquecer por um momento quão retrógrado é o Presidente e note objetivamente os seguintes fatos:
Bolsonaro 2020 demonstrou uma evolução política admirável em relação ao de 2019, passando de participante em manifestações de repúdio ao Congresso e ao STF para um líder consciente de que há três poderes independentes. Nenhum respeito, infelizmente, pela missão da Mídia…
A busca do apoio do Centrão, longe de renegar uma promessa prioritária de sua campanha, é prova de amadurecimento político, de quem aprendeu com o desastre de Collor que, sem maioria parlamentar, não se governa. Nem aqui nem em qualquer regime democrático.
A pandemia e as eleições municipais impediram que, em 2020, o debate fosse focado na modernização da economia. Agora, com a eleição de um novo comando do Congresso avesso ao impeachment e o início da vacinação, há esperança de que o Governo passe a jogar no ataque, na batalha pela aprovação de seus projetos. Nada disto alivia o descaso deste governo com a vida, ecologia e grupos minoritários. Mas deve-se reconhecer que o comportamento político do Presidente só fez evoluir desde sua posse. Vamos, então, à condução da economia:
Paulo Guedes está no governo porque acredita que pode fazer diferença na modernização da economia. Não haverá fritura, porque, muito antes, ele terá pedido as contas. Se ele continua ministro é porque tem apoio e aprendeu, como Bolsonaro, que o jogo democrático exige tempo e paciência. Ninguém dos que saíram da equipe econômica alegou desvio bolsonariano da rota liberal e sim desconforto com a lentidão com que as reformas avançam em Brasília. E todos foram substituídos por talentos de mesma respeitabilidade, prova de que a crença na missão modernizante está preservada.
O déficit fiscal está sendo visto por analistas com lentes distorcidas. Vale lembrar que há anos, desde o patético final do Governo Dilma, ele só tem diminuído, refletindo a nova percepção da sociedade quanto aos malefícios de um governo gigante. Acusar de leviano um governo que explodiu o déficit em 2020 é ignorar que o déficit é o déficit e sua circunstância: não precisa ser um keynesiano obsoleto para entender que era imperativo compensar, via subsídios, a queda dramática da demanda agregada, resultante de se travar a produção por medidas de isolamento. Aliás, como fizeram todos os gestores fiscais responsáveis mundo afora. Passada a ameaça, com a disseminação da vacina, vai-se voltar ao compromisso anterior de austeridade, bandeira eleitoral de vários parlamentares eleitos em 2018.
Similarmente, em relação à política monetária. Pela primeira vez, um comando do Banco Central teve a coragem de colocar a taxa de overnight em 2%, aproveitando circunstâncias favoráveis. Cobrar que se eleve porque os preços no atacado dispararam é de uma ignorância desumana: como usar juros para enfrentar um choque de oferta, que, ao mudar preços relativos sem se perpetuar pela indexação, tem em si a própria cura?
As inúmeras crises do passado tinham um traço comum: o desarranjo das contas externas, a falta de reservas internacionais. Especular sobre default com mais de US$ 300 bilhões de reservas, capital de risco entrando em montante bem maior do que o déficit em transações corrente e sem que haja valores significativos de títulos públicos resgatáveis em moeda forte é mostra de rigidez mental imperdoável.
Moral da história: Pode-se esperar avanço na economia brasileira em 2021. Não o que desejaríamos e sim o resultado possível da negociação política. O PIB vai crescer perto de 4%, preferentemente sem subsídios volumosos, que virão só se o crescimento fraquejar. Preços ao consumidor crescerão perto de 3,5%, enquanto a taxa Selic pouco se afastará de 2%, com juros futuros em queda. Câmbio oscilando entre R$5,0 e 5,5/ dólar. Com pandemia sob controle, inegavelmente um ano novo mais feliz.


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