Em entrevista exclusiva, a presidente do Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais, Rosa Maria Abreu de Barros, ressalta que mudanças serão necessárias para um melhor funcionamento do programa

MC: O eSocial nasceu em 2014, projetado pelo Governo Federal, com o objetivo de ser uma revolução digital no universo burocrático das informações trabalhistas. No entanto, este projeto tem um histórico marcado por controvérsias e em julho, houve um ponto máximo de polêmica: a decisão pela extinção dessa plataforma. Mais uma vez o mercado dividido entre os que comemoram e aqueles que defendem o fim dessa plataforma. Qual a visão do Conselho Regional de Contabilidade mediante esta realidade?
Rosa Maria: Sim, o eSocial foi criado para reunir dados trabalhistas, fiscais e previdenciários de trabalhadores de forma mais eficiente e com exatidão das informações, objetivando também a redução de fraudes. O objetivo principal do eSocial foi a simplificação e eficiência do sistema. Ao ressaltar a percepção de controvérsias, é normal, pois toda mudança gera expectativas e muitas das vezes grande resistência. No caso do eSocial, a implantação do sistema foi programada para cinco fases, sendo a primeira voltada para empresas com faturamento superior a R$ 78 milhões anuais, que passaram ter a utilização obrigatória do programa a partir de 08 de janeiro de 2018. Este grupo foi representado por 13.707 mil empresas e cerca de 15 milhões de trabalhadores, o que representa aproximadamente 1/3 do total de trabalhadores do país. As demais fases foram sendo implementadas ao longo do tempo, de acordo com cronogramas definidos pelo Comitê Gestor, até que em 09 de julho de 2019 o governo informou que o eSocial seria substituído por dois sistemas a partir de janeiro/2020. Ao invés de transmitir todos os eventos para o mesmo ambiente, as informações trabalhistas e previdenciárias passarão a compor um sistema e as informações tributárias outro. Essas mudanças ocorreram devido às polêmicas geradas pela dificuldade de adaptação e atualização e dados.
Nós, contadores, defendemos a qualificação, a transparência e eficiência na prestação de serviços aos nossos clientes e empregadores, e isso o ambiente virtual nos proporciona. Sabemos das dificuldades encontradas, mas precisamos superá-las, pois o mercado exige que a prestação de serviço seja de qualidade. O eSocial é um grande sistema e tem como objetivo muito claro e evidente, que precisa de atualização e investimento em tecnologia e em treinamento de pessoal.

MC: A substituição do site foi anunciada pelo secretário da Previdência e Trabalho, Rogério Marinho. Ele explicou que em 2020, o Sistema de Escrituração Fiscal e Digital das Obrigações Fiscais Previdenciárias e Trabalhistas – e-Social – vai dar lugar a duas plataformas: uma para o envio de dados à Receita Federal e outra, voltada para as informações sobre a mão de obra das organizações. Como será isto na prática?
Rosa Maria: Entendo como acertada a decisão. Infelizmente muitas, pequenas e médias empresas ainda têm muito a melhorar com relação a cadastros e investimentos em tecnologia básica. Inclua nesta alteração outra mudança, como a nova carteira de trabalho digital, que vai substituir a de papel a partir de setembro em todo o país.

MC: Na sua opinião, a decisão da extinção da plataforma teve um ponto crucial? Muitos afirmam que havia um excesso de complexidade da plataforma, outros ainda relatam o alto custo de implantação e gestão, além da demanda de atualização, na maioria em tempo real. O que você acha que realmente contribuiu para este cenário?
Rosa Maria: Sim. Diante de tantas dificuldades, até pelas empresas de softwares em adaptar os sistemas, relatos de profissionais, o que contribuirá para este cenário será a simplificação do sistema, novas oportunidades de trabalho, aumento na arrecadação, o que na minha opinião pode movimentar de forma satisfatória a economia do país. Acredito que com estas novas alterações as empresas terão mais facilidade para se adequarem ao novo sistema.

MC: Com a promessa de modernizar, integrar e ter mais avanços, na prática, o que se escuta é o contrário. Muitos alegam que aumentou, absurdamente, a burocracia. Levando em consideração os adeptos e os contrários, como você viu o e-Social na prática? Será que haverá melhoria real?
Rosa Maria: Vejo o eSocial como um excelente instrumento de controle fiscal para o governo, que traz para o mercado a percepção do risco, o que gera mais transparência e reduz a contingência das empresas ao longo do tempo. Considero que para o trabalhador é um ganho, pois será garantido seus direitos trabalhistas como a legislação exige.

MC: Em sua opinião, criar este projeto foi um avanço ou retrocesso? Seria o caso de aperfeiçoar a ferramenta e o método?
Rosa Maria: Considero o projeto um grande avanço. Volto a comentar que a base do eSocial e o controle e a transparência, se quisermos fazer as mudanças no cenário trabalhista, previdenciário e fiscal, este é o caminho. Quando verificamos que os programas, até então utilizados para o envio de informações trabalhista e previdenciária não foram eficientes, inclusive com retrabalhos, pois muitas declarações apresentavam exigências de informações repetitivas. E diante da reforma trabalhista é clara a necessidade de mudanças no envio das informações.

MC: Mediante este cenário o que muda de fato para as empresas, indústrias, trabalhadores e governo? O que devemos esperar pela frente?
Rosa Maria: O que mudará para as empresas será a cultura! A prática do jeitinho brasileiro precisa ser deixada no passado ou a empresa será responsável por um impacto indesejável nos custos, neste contexto o setor de RH precisa estar capacitado por disseminar o conhecimento da legislação entre todos os colaboradores e criar ou fortalecer as habilidades de planejamento dos gestores nas contratações e rotinas.  As empresas terão melhorias no cumprimento das obrigações trabalhistas, previdenciária, fiscal e social que irão reduzir as contingências (riscos que até o momento não são verificados pela fiscalização). Acredito que haverá redução da informalidade na relação trabalhista reduzindo a concorrência desleal entre as empresas.
Para os empregados, o dinamismo, a atualização e a transparência dos dados e informações permitirá a desburocratização dos procedimentos trabalhistas e previdenciários a exemplo nos processos de aposentadoria e/ou benefícios previdenciários.
Já para o governo haverá aumento do mecanismo de controles e na capacidade de fiscalização tanto do Ministério do Trabalho como do fisco federal que conseguintemente aumentará a arrecadação. Esse é o caminho, mudanças são necessárias.

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