Duas maiorias muito diferentes
Duas maiorias muito diferentes
Duas maiorias muito diferentes

Roberto Brant*

Todos no Brasil estamos acostumados com presidentes que se elegem sem maioria no Congresso e gastam a melhor parte de seu capital político num esforço patético para formar uma maioria improvisada, mesmo que sem alma nem convicções, para assegurar um mínimo de governabilidade. Nosso sistema eleitoral, em sua exótica originalidade, praticamente impede que o voto majoritário para presidente da República tenha a necessária correlação com a votação para a Câmara dos Deputados. Está aí a principal fonte da corrupção na política e da inépcia de muitos governos.

Governos sem maioria não governam e, no limite, não sobrevivem todo o mandato. Por esta razão o primeiro dever de um governante é construir esta maioria. Governantes que não a buscam, negligenciam seu dever de governar e passam seu mandato fingindo que governam e reclamando da vida.

O presidente Lula ganhou uma eleição nitidamente plebiscitária, mas elegeu pouco mais de 25% dos deputados. Acontece que ele domina muito bem as habilidades necessárias para conquistar os adversários no Congresso, embora no passado isto lhe tenha causado contratempos. Com sua experiência está, aos poucos, se assegurando de um amplo espectro de apoios na Câmara e no Senado. No reino da política a paz já é uma realidade.

No reino da vida real as coisas são muito diferentes, pois o nosso Parlamento é uma representação muito imperfeita da nossa população. Maioria no Congresso não é necessariamente maioria na sociedade. Nunca em nossa vida democrática uma eleição presidencial foi vencida por uma margem tão estreita. Nunca também em nossa história uma eleição presidencial foi marcada por tanta confrontação e tanto acirramento de ânimos. Parecia uma decisão existencial e não uma rotineira sucessão eleitoral democrática. Nunca antes havíamos sequer imaginado que num mesmo território conviviam dois Brasis, tão separados e tão irreconciliáveis.

Embora algumas semanas tenham se passado, os fluxos de mensagens nas redes sociais e o ânimo das pessoas na sua vida cotidiana nos advertem que a amargura política e o inconformismo dos que não venceram não são sentimentos superficiais, destinados a desaparecer a qualquer momento. O espírito de confrontação e até de desespero está resistindo até às conveniências.

É impossível governar um país neste estado de divisão, pelo menos com os meios da democracia. E nosso país não suportará mais um governo paralisado e sem forças para realizar mudanças muito profundos. A falta de crescimento do Brasil, que dura mais de 40 anos, e o alto grau de pobreza da população pedem um governo forte, amparado por amplos consensos e para o qual todos possam torcer. Mais um governo fracassado e focado em agendas irrelevantes e estéreis é tudo o que não podemos voltar a ter.

Conquistar o Parlamento brasileiro é uma coisa. Outra, muito diferente, é conquistar uma ampla e clara maioria na sociedade brasileira. As moedas que servem para seduzir os políticos não tem valor no mundo das pessoas comuns e dos cidadãos. Aqui não servem de nada as emendas e os cargos. Aqui é preciso oferecer gestos, atitudes, comportamentos e resultados.

O Presidente Lula recebeu este desafio do destino: ser um governo de transição entre a guerra e a paz. Precisa governar para os seus e para os outros. Se não fizer isto não governará para ninguém, porque o país pode tornar-se um campo de batalha permanente.

O povo brasileiro deu ao PT e às esquerdas uma presença muito minoritária no Congresso, embora tenha escolhido Lula para presidente. Não há contradição nisto. O povo confiou a Lula, pelo seu passado e pelo ponto em que está na vida, o papel de isolar os extremos e reconfigurar um centro político progressista. Certamente não deu a ele um mandato para implantar as políticas e a visão do mundo do PT e das vanguardas culturais do país.

Se Lula quiser apenas repetir o passado, com seus velhos companheiros, vai fracassar. Se ousar, como disse um velho professor paulista, começar a construir um país novo e que nunca existiu, vai merecer um lugar na história.

*Advogado, ex-deputado federal e ex-ministro da Previdência

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