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Por: José Maria Couto Moreira

 

O anedotário político mineiro é rico em epigramas que estão entre o ensinamento da moral junto a uma mordacidade espirituosa, e aí está a verdade.

 

Corre por este vasto Brasil o anedotário da política e dos políticos mineiros. Ele é longo, variado. É preciso que tais episódios sejam ressuscitados à luz da tradição oral, porque são estuários de importante ensinamento para aqueles que se iniciam na cena política, e uma história inesquecível para a interpretação do comportamento do mineiro, tido e havido como conciliador, aguerrido sem bravatas.

Está no topo de nossa crônica secular o episódio protagonizado pelo saudoso Milton Campos, homem de espírito fino, anatoliano por formação, que hauriu nos franceses o pensamento cético, mordaz.

Pois estava Milton governando nosso Estado quando chegou para nos visitar o caudaloso George Duhamel, romancista, poeta, respeitável humanista francês; e Milton, seu irmão de espírito, pôs-se a ciceroneá-lo por nossos sítios históricos, havendo Milton se deleitado com a companhia de alma tão fluente e tão doce. Retornando Milton ao Liberdade, havia lá, como era comum naquela época, um deputado que o aguardava há algumas horas, pretendendo, como anteciparam os auxiliares a Milton, a exoneração de um delegado municipal, expediente avesso ao estilo e à prática política de nosso então governador. Com a insistência e a sofreguidão de sua antessala, Milton ilustrou para seus auxiliares a história do perfumista francês: um dia, despediu-se o perfumista de sua mulher para dirigir-se ao trabalho. Havendo notado faltar-lhe um documento de que precisava, voltou a casa, momento em que a mulher recebia o amante em despudoradas carícias. Percebendo a mulher a gravidade do momento, em rápido movimento introduziu o amante no armário do perfumista, único refúgio que possuía a circunstância. Recobrando o marido o documento e saído de volta ao trabalho, apressou-se a mulher em libertar o amante de tão incômodo abrigo. Ao abrir a porta, encontra o amante desfalecido. E tão culpada sentiu-se a amante que o sacudiu, perguntando ao companheiro o que ele sentia, ou de que precisava – um copo d’água, talvez? “Non”, responde o amante, “un peu de merde, s’il vous plaît” ! , isto é, após o perfume que exalava a presença de Duhamel, surge agora o enjoo, por isto dizendo Milton a seu oficial: faça entrar o deputado !

 

Ainda Milton, que encarnava a figura do romano em atitudes republicanas, cujos episódios mais o realçam como homem da lei, porém nunca apelando à violência para cumpri-la, decidiu com elegância e graça o episódio que mais o qualificou como verdadeiro magistrado, e mais o aproximou de seu juramento declarado no momento de sua posse, quando registrou a ênfase de sua administração de que seu governo seria mais da lei do que dos homens. As passagens deste período de nossa história política registram episódios antológicos como aquele em que estourou a greve na Rede Mineira de Viação, à alegação dos ferroviários, com razão, de estarem com salários atrasados. Reuniram-se em Palácio os homens da segurança pública, cada um opinando pela solução radical, outros, no mínimo, defendendo um constrangimento de natureza repressora. A todos Milton ouvia. Depois de esgotarem as alternativas para o término do movimento, todas elas opressoras, sentenciou o governador: Senhores, não seria melhor mandar o trem pagador ? Com tal diretriz, estava vencido o impasse.

Outro episódio hilariante ocorreu no recém-empossado governo Magalhães Pinto. Como sabem seus contemporâneos, era comum a concessão de passes pelo Palácio, onde supostos necessitados buscavam autorização de viagens sem ônus, naquela época algo de corrupto no cotidiano mineiro. Pois vai a Palácio um cidadão e, frente ao guichê, transmite seu desejo de obter um passe para Bom Despacho. O funcionário não apenas nega como profere uma catilinária sobre aquele pedido absurdo: Agora, quem governa é a UDN, e a imoralidade deste expediente não encontra mais guarida ! O interessado, que a tudo ouviu serenamente, agradece e vai-se. Daí a dois meses volta ao mesmo guichê, e, candidamente, indaga do mesmo funcionário: Vocês já estão dando passe ?

 

A crônica mineira registra, também, o fato de um eleitor que estava com ideia fixa de ir à lua. Procurou ajuda. Um amigo aconselhou-o a ir ao Benedito Valadares, porque o homem tinha escrito um livro “E a lua caiu”. Recebido por Benedito, ganhou um porta a fora, certo o escritor do deboche. Depois lhe foi recomendado ir ao Alkmim, que ponderou-lhe : mas qual lua deseja o amigo visitar, pois temos a crescente, a minguante, a nova e a cheia. O solicitante foi pego de surpresa, e, não sabendo responder, levou o assunto para casa, para melhor refletir…

No período imediatamente anterior à posse de Rondon Pacheco como governador de Minas, um cidadão pôs a circular notícia de que houvera sido convidado a ocupar determinada Pasta. Como a confirmação não viesse, o indigitado secretário interpelou Rondon: Governador, todo mundo diz que serei secretário em seu governo. Como respondo ? Diga que você foi convidado mas não aceitou …

Ainda é do período de Rondon o fato atribuído a um de seus auxiliares de gabinete, muito solícito, daqueles que se aprazem em agradar seu chefe. Convidado pelo governador a descer as escadarias do Liberdade, diante da hora para encerrar o dia estafante daquele dinâmico homem público, respondia-lhe: Descer com Vossa Excelência, é subir !

Consta ainda neste imenso folclore a cena em que dois coronéis compadres conversavam e trocavam ideias sobre o futuro dos filhos. Dizia o primeiro: Olha, compadre, estou tranquilo com o futuro de meu filho. Está noivo de fulana, filha do senador Beltrano, líder do PSD no Senado, como você sabe, homem de grande prestígio. Já deu sinais de que selará o ingresso do genro na política federal. E você, compadre, que me diz do Josué, seu primogênito ? Ah, compadre, o coronel Ciclano prometeu a Juliana para o meu Josué. Ora, fico feliz, redarguiu o compadre interlocutor, pelo que se vê você não tem por que se preocupar. O sogro é homem respeitado e de muita importância da UDN, fará tudo por ele, estou certo. Sobrecenho carregado, voltou-se o amigo: Num sei não, coronel, num sei não, a UDN num dá garantia…A UDN num dá garantia…

É por essas e por outras que se aceitam menos os homens, e mais as suas crônicas, ou, ainda, a versão acaba mais verdadeira

que o fato …

 

 

 

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