*Por Stefan Salej

Qualquer análise isenta do comércio mundial indica que o saldo da balança comercial brasileira do ano passado, de 46.6 bilhões de dólares, é digno de aplauso. Independentemente do fato de ser menor do que em 2018 em 58 bilhões de dólares, ainda é um número respeitável. Mesmo o Brasil participando pouco do comércio mundial, 1%, e nossas importações representarem pouco no PIB, são números expressivos. Mas, o que importa mesmo é de um lado a perspectiva para os próximos anos e de outro lado o balanço de pagamentos e reservas cambiais.

Os dados finais do balanço de pagamentos ainda não foram divulgados, apenas o referente a novembro de 2019. Indicam um déficit de 51 bilhões de dólares. Somos deficitários na área de serviços e viagens e pesam muito remessas de lucros, juros, aluguel de equipamentos e, em menor escala, transportes. Por outro lado, houve um ingresso de capitais estrangeiros de 69,1 bilhões de dólares. E, para concluir os dados, nossas reservas internacionais foram de 366.4 bilhões de dólares. A essas reservas podem-se somar outros 500 bilhões de dólares das pessoas físicas que os brasileiros levaram para investir fora do país e que não fazem parte das reservas oficiais.

Ainda há a dívida externa. O Brasil devia em fevereiro de 2019, 319 bilhões, mas a grande divida não é do governo brasileiro, e sim do setor privado que, aproveitando os juros baixos e o câmbio estável, se endividou no mercado internacional. Por alguns cálculos, que podem n?o ser exatos, esta dívida ultrapassa os 500 bilhões de dólares.

O governo e o Banco Central, mesmo com deslize nas estatísticas do comércio exterior em novembro, “esquecendo” de somar alguns bilhões de dólares na conta de exportações, pode-se dizer que tem dados, informações e técnicos confiáveis. Ou seja, temos tudo o que quem sabe escrever pode fazer. Agora, a leitura desses dados para os próximos anos é bem diversa. Para começar, comércio e relações econômicas internacionais não são um assunto nem de curto prazo e nem para ignorar que elas não se chamam à toa internacionais. Os fatores externos são determinantes nessas relações. É o mundo que determina as condições como você se move nessa esfera e não você.

A euforia de que tudo está maravilhoso deve ser urgentemente substituída pela racionalidade e visão de longo prazo do mundo em que vivemos e com o qual nos relacionamos.

A política externa, seja ela diplomacia presidencial, ou exercida pelo Itamaraty e outros atores, deve ter em vista os resultados nas nossas contas externas. Essas contas dependem do aumento de exportações, de acordos internacionais implementados e de investimentos estrangeiros. No ano passado, a volatilidade na nossa política externa, sejam nossas posições em relação ao meio ambiente, Oriente Médio, relações com China e Estados Unidos ou as relações com Argentina, se sobrepuseram à vitoriosa negociação com a União Europeia. Sem falar da Venezuela.

O nosso aumento de exportações esbarra num problema simples: exportar o que para quem. Nossa base produtiva, mesmo Agro Pop tão cantado aos quatro ventos como grande sucesso, é fraca e ninguém responde se podemos exportar por exemplo este ano 224 bilhões, como no ano passado, ou 250 bilhões. No ano passado, se a desgraça não atingisse com a crise de carne a China, de quanto teria sido a nossa exportação? Sem dúvida, bem menor. Como exemplo, São Paulo não possui um plano de exportações paulistas nem para este e muito menos para os próximos anos. O governo paulista abriu escritórios na China e nos Emirados Árabes, mas para trazer investimentos e não para aumentar as exportações. Então, imagine no resto do país.

A propagada de abertura do país, que quer dizer mais importações, só terá sustentabilidade se tivermos dólares para pagar. É o caso de viagens internacionais. Brasileiro só viaja ao exterior porque compra dólares livremente. E de onde vem o dólar mais sustentável para a economia? Das exportações.

E para exportar precisamos ser competitivos, o que não nos leva só à questão do chamado custo Brasil, câmbio, reformas, educação, mas principalmente ao atraso tecnológico que o país vive. E também quem são os exportadores, com que produtos, para que países.

Não se pode baixar a guarda e nem se comportar de forma amadorística, nem com euforia. Está mais do que na hora de aceitarmos como premissa básica que sem exportações não há estabilidade

*Empresário, ex-presidente da FIEMG-Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Diretor do Departamento de Comércio Exterior da FIESP-Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da publicação.

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