*Por Sérgio Augusto Carvalho

É velho o ditado “comer e coçar é só começar”… Deve ser um lema levado a sério por todos que abrem um Restaurante ou qualquer tipo de Casa de Pasto. Ninguém vive sem comer, isso é certo. A fartura é que depende da época em que se vive.

         Hoje em dia a fartura não é de comidas e, sim, de Casas de Pasto. Cada quarteirão de BH tem, pelo menos, dois restaurantes, ou lanchonetes ou supermercado, todos oferecendo vários tipos de comida.

         De certa forma, essa história é velha. Ao contrário do que alguns historiadores afirmam, Minas Gerais sempre foi um exemplo para o Brasil quando o assunto é Gastronomia.

Comida caipira ou comida mineira, não importa de como possam chamar o que o mineiro tradicionalmente leva à sua mesa no dia a dia das famílias ou grupos sociais – confrarias, turmas ou associações. Essa comida está sumindo dos ajantarados de sábado e almoços de domingo.

         Os restaurantes de comida mineira em BH são os mesmos de 30 anos atrás. De vez em quando um restaurante respeitável faz uma “revisitação” de algum prato tradicional introduzindo um visual e efeitos modernos para juntar a fome com a vontade de comer.

         Continuo afirmando que Minas tem a melhor, mais saborosa e mais farta cozinha do Brasil.

         No Brasil Imperial, os exploradores europeus que desembarcavam aqui para explorar as nossas riquezas, só encontravam hospitalidade e boa comida quando passavam as fronteiras do Rio de Janeiro e São Paulo para se emaranhar nas montanhas de Minas Gerais.

         Segundo cita Virgilio Mello Franco, em publicação do Século XIX, os mineiros eram naturalmente gentis quando em suas Fazendas e Quilombos surgiam viajantes com suas grandes ou pequenas expedições. Se fora daqui a hospitalidade era precária e pouco encontravam o que comer, em Minas o Lombo com Feijão e Torresmo os deixavam extasiados até a próxima parada.

         A história relata que, após Curral Del Rey ser proclamada a nova Capital das Minas Gerais, o então estudante de medicina carioca Olavo Bilac, jornalista, cronista e escritor parnasiano, se refugiou aqui em busca do que os estrangeiros já haviam afirmado antes de voltarem aos seus países: “em Minas Gerais se come tanto e tão bem, que os companheiros têm olhos espantados para tanta voracidade”.

         Nada como descrever um almoço mineiro, segundo Olavo Bilac: “Na toalha alva fumega o feijão de Minas, em cujo caldo espesso se desdobram folhas de couve repolhuda. O verde tenro dos quiabos casa-se ao amarelo fulvo da abóbora, de face tostada, com reflexos de ouro velho. Entre o assado gordo, de onde se eleva espiral de aromas, as fatias finas do lombo, nadando em molho, cujo cheiro embriaga – esplende o angu de fubá, de massa compacta e clara, estremecendo no prato como bolo de gelatina”. ]

         No começo do Século passado, a tradição de levar os quitutes mineiros à mesa dos visitantes proliferou não sem, antes, sofrer um tranco de difícil explicação. Com o desenvolvimento da nova Capital, Belo Horizonte viveu a invasão de imigrantes portugueses, italianos, espanhóis e franceses, estes trazendo a fama da sua culinária “três chic”, a ponto de contaminar setores da nossa vida social.

         Assim aconteceu, em 1903 o que se poderia chamar de golpe contra as tradicionais iguarias mineiras: o Presidente do Estado, Affonso Augusto Moreira Penna, ofereceu um banquete a Santos Dumont inspirado nos costumes franceses menosprezando as tradições locais.

         O “Menu”, impresso e colocado à frente de cada um dos 25 convidados, era este:

         “Potage: Crême d’Asperges

         Hors-d’oeuvre: Petits Patés Fins

         Relevé: Salmis de Gibier

         Rôtis: Filet de Porc a la Mineira; Dinde Farcie; Jambon d’York

         Desserts : Crême gracée a la Vanille, Puddings, Fruits Sorties, Frommages et Glacés

         Vins : Chablis, Pommard, Chambertin, Old Port Wine e Champagne Veuve Glicot

Café et Liqueurs.’’

         Não fosse pelo « filet de porc a la mineira », poderia se dizer que o regabofe foi em Versailles.

Essa parte da historia gastronômica mineira é interessante, vem de séculos passados e vale a pena relembrar. Já que começamos, vamos continuar: “comer, coçar e relembrar é só começar”!

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