Entrevista – Roberto Simões
Presidente da FAEMG e do Conselho Deliberativo do Sebrae/MG e 1º Vice-Presidente da CNA

Na contramão positiva da economia nacional, o agronegócio foi o único setor que cresceu no 1º trimestre deste ano, no comparativo com igual período de 2019. O incremento de 0,6% nesse intervalo, as diversas medidas adotadas posteriormente para proteger os ramos do negócio durante a pandemia e a forte presença dos produtos na balança comercial mineira – com aumento de 9,4% no valor e 31,4% no volume das exportações demonstram que, apesar dos percalços, a expectativa para este ano é positiva.

Minas Gerais é o quinto maior exportador do agronegócio no país. Segundo dados da Federação da Agricultora e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Sistema Faemg), os principais setores exportadores do agro são: café (39,8%), complexo soja (28%), carnes (11,5%), complexo sucroalcooleiro (10%) e produtos florestais (6,3%). Outros itens importantes da pauta mineira de exportação do agro tiveram considerável aumento dos valores comercializados, como foi o caso da soja em grãos (52,4%), carne bovina (14,7%), carne suína (93,7%), açúcar (61,6%) e álcool (77,9%). A China figurou como o principal dos nossos produtos, especialmente de soja, açúcar e carnes bovina e suína.

Segundo o engenheiro agrônomo pela Universidade Federal de Viçosa, Magister Scientiae em Economia Rural (UFV), presidente da Faemg e do Conselho Deliberativo do Sebrae/MG e, ainda, 1º vice-presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Roberto Simões, o Sistema FAEMG/SENAR/INAES, por meio do escritório estadual do projeto AGRO.BR, uma parceria entre o Sistema CNA e a Apex Brasil, tem um programa de orientação e capacitação dos produtores e empreendedores de cadeias produtivas selecionadas para abertura do mercado internacional, com estágio inicial nos países asiáticos.

Mas essa não é a única iniciativa da entidade para valorizar o produtor e o agronegócio de Minas Gerais, um setor que tem demonstrado sua força durante a pandemia de Covid-19. “Não há sinalização de dificuldades e desabastecimento. Desde o início, a aprovação do setor como prioritário foi muito importante para a continuidade das ações. O produtor rural se reinventou, buscando estratégias para se adequar nas propriedades rurais, cumprindo as recomendações para diminuir a disseminação da doença. Manteve-se ativo e produzindo”, comemora sem esconder a confiança no setor do qual está a frente há tantos anos.

E se o produtor não parou, o Sistema Faemg também se manteve em atividade para auxiliar os empresários a encontrar saídas para a comercialização e para o aumento dos custos da produção. E os resultados têm se tornado realidade, por meio da ampliação do volume de recursos para custeio e do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé), para o ano-safra 2020-2021, redução de juros e priorização de programas de investimento. Além disso, o aumento do valor na subvenção ao Prêmio do Seguro Rural do Plano Agrícola e Pecuário (PAP), em 30%, chegando a R$ 1,3 bilhão, é essencial para atender um maior número de produtores rurais e permitir que, em caso de perdas, tenham o ressarcimento, o que garante a manutenção na produção.

“Estamos trabalhando com o Governo Federal as adequações para o Zoneamento de Risco Agroclimático de diversas atividades produtivas, o que levará também a melhorias dos produtos de seguro rural”, adianta o dirigente que, na entrevista abaixo, fala um pouco mais sobre as medidas que foram adotadas para proteger o agronegócio e a pecuária de Minas Gerais, durante o período de incertezas causado pela pandemia, mas reafirma a força do setor.

 1) O que o Sistema FAEMG tem feito nesse momento em que o agro foi o único setor positivo na economia, mesmo com a pandemia?

Dada a nossa capilaridade no estado com 385 Sindicatos e nossos canais de comunicação, a nossa tarefa no agronegócio é complexa e com um leque muito grande de atividades que visam atender as demandas dos produtores, dos setores produtivos e articular as soluções seja com outras instituições privadas, seja com o poder público, com o Estado. Não paramos nossas atividades na pandemia, adaptamos nossos atendimentos e, mesmo em teletrabalho, as ações continuaram e se avolumaram.

Especificamente sobre o impacto da pandemia nas cadeias produtivas, desde antes vínhamos monitorando o que estava ocorrendo em outros países e, tão logo foi decretada a emergência em nosso Estado, intensificamos a averiguação junto aos produtores, sindicatos e cadeias produtivas.

Preparamos e divulgamos cartilha com orientações aos produtores sobre como adequar suas atividades e cumprir as recomendações das autoridades de saúde, acompanhamos e trabalhamos com os sindicatos em negociações com as prefeituras para garantir a circulação das pessoas, a realização colheita e demais atividades produtivas e manter o escoamento da produção.

Uma forte preocupação era com a colheita de café, que tem uma demanda alta de mão de obra, e que teve início em abril, e também de citrus (tangerina). Para esses produtores, também orientamos muito de perto e acompanhamos a evolução da safra, que esse ano é maior, dada a bienalidade positiva.

Outra ação bastante importante foi na orientação aos produtores e ações junto às instituições financeiras, para medidas emergenciais do crédito rural para as cadeias mais afetadas com a dificuldade de comercialização. Também atuamos fortemente nas questões trabalhistas e nas orientações.

Passando para o impacto nos setores produtivos, ressaltamos as dificuldades enfrentadas pelas cadeias de aquicultura e floricultura, que sofreram redução de demanda imediata – pela paralisação de eventos e da Páscoa, que dificultaram ou impediram a comercialização.

2) E a pecuária?

Na pecuária de leite, a queda mais forte na produção de leite no país ocorreu em abril e o ritmo menor de crescimento do volume captado em maio colaboram para um ajuste do lado da oferta de matéria-prima (leite cru), em meio à demanda interna patinando. A captação do leite nas fazendas no segundo trimestre ficou em média 5,5% menor em relação ao mesmo período do 2019, considerando a média.

O efeito da pandemia foi a redução de investimento pelo produtor, diante da queda do preço pago pelo leite cru e elevação de 14,1% do custo de produção. A queda na captação deu um certo equilíbrio no mercado e melhorou ambiente de preços ao produtor mais firmes em junho, inclusive, com possibilidade de valorização, caso a demanda melhore. E é o que temos verificado nas publicações do CONSELEITE-MG.

3) A colheita da safra 2020-2021 foi positiva?

A grande agricultura com a colheita da safra de grãos – maior do que no ano anterior – não teve grandes problemas. Pelo contrário. Houve aumento das exportações, especialmente do complexo soja. O dólar apreciado também garantiu nossa competitividade.

Especificamente em abril, vimos agravada a situação do setor sucroenergético, com redução do consumo de álcool por diminuição da circulação de pessoas, de abastecimento de veículos e queda do barril de petróleo.

Em maio e junho, diversas iniciativas que favorecem a comercialização dos produtos (MERCADO CNA – virtual; Catálogo GUIA VIRTUAL EMPÓRIO SENAR; realização de eventos com os protocolos da FEIRA SEGURA) e de iniciativas por aplicativos e delivery foram adotadas. O consumo das famílias se alterou, fazendo com que o setor de hortifrúti também buscasse estratégias de comercialização. A produção foi prejudicada pelas intensas chuvas no primeiro trimestre, principalmente das hortaliças folhosas. O produtor rural teve problemas para a comercialização – fechamento do foodservice e dificuldades para promoção de feiras livres. A perspectiva é que, com a flexibilização (estabelecida pelas prefeituras), o cenário melhore um pouco. Mas ainda há preocupação com redução do poder de compra pela população, desemprego.

Também em junho, atestamos as informações das pesquisas IBGE, com os dados de acompanhamento da indústria. Verificamos que, com as medidas de isolamento necessárias para o combate da pandemia, a oferta e a demanda de produtos agroindustriais foram impactadas, principalmente em abril e maio, quando a limitação de circulação das pessoas ficou mais rígida. Contudo, a produção agroindustrial apresentou um melhor desempenho em maio do que o verificado em abril.

Também acompanhamos com forte preocupação o aumento de casos da COVID em plantas frigoríficas em outros estados, como Rio Grande do Sul e Mato Grosso, que levou a uma atuação alinhada com as Associações de Produtores (ASEMG, AVIMIG, AFRIG) e IMA para elaboração de planos de contingência. Está em processo de estruturação, para o caso de necessidade de interrupção de alguma planta e escalonamento de produção para outra localidade.

4) Como foi o resultado do agro mineiro?

Até o momento, o setor produtivo garantiu o suprimento de alimentos à sociedade e manteve o intercâmbio comercial fluindo, embora os custos de produção já impactem as cadeias. A agropecuária foi o único setor que apresentou resultados positivos no 1º trimestre do ano, com alta de 0,6%, enquanto os outros setores da economia caíram.

Dois setores se destacam nesse cenário. O primeiro é a pecuária de corte, devido aos preços e, no caso dos grãos, a cotação do dólar é um atrativo a mais para os produtores.

 5) O desabastecimento tão temido não se tornou realidade. Como tem sido a participação do produtor rural nesse processo?

Temos absoluta tranquilidade que o desabastecimento não ocorreu e não ocorrerá. Problemas pontuais de logística podem ter sido registrados, especialmente no início da pandemia e com o fechamento de alguns municípios. Mas foram rapidamente transpostos, com as negociações e orientações locais, junto às prefeituras e demais autoridades.

Não há sinalização de dificuldades e desabastecimento. Desde o início, a aprovação do setor como prioritário foi muito importante para a continuidade das ações.

O produtor rural se reinventou, buscando estratégias para se adequar nas propriedades rurais, cumprindo as recomendações para diminuir a disseminação da doença. Manteve-se ativo e produzindo.

E, também com nossa participação, eventos como a FEIRA SEGURA – proposta pelo Sistema CNA  –, foram promovidas em alguns municípios, com nossa orientação, adoção de todos os cuidados e acompanhamento, gerando o retorno da realização das feiras livres no interior.

 6) Quais os projetos que a FAEMG tem desenvolvido para proteger o agronegócio mineiro?

Nesse momento da pandemia, trabalhamos junto à CNA para as articulações de medidas emergenciais, dados os efeitos negativos nas diversas cadeias produtivas – especialmente por questão da dificuldade de comercialização. Foram publicadas as Resoluções 4.801 e 4.802 e trabalhamos na sua divulgação junto aos produtores – com comunicados jurídicos sobre o enquadramento – e nas negociações com as instituições financeiras para o atendimento às demandas que tivessem.

Sempre importante lembrar que o produtor tem o direito de se pronunciar junto aos bancos em caso de alguma dificuldade no desenvolvimento da atividade produtiva, independentemente de ter medida emergencial, conforme o Manual de Crédito Rural (MCR 2.6.9). Em nosso site (www.sistemafaemg.or.br) constam modelos de cartas que podem ser utilizadas pelos produtores.

Outro projeto importante é o FAEMG SEGUROS, um produto que disponibilizamos aos produtores em Minas Gerais. Temos parceria com uma corretora, que poderá verificar a melhor cotação com as seguradoras no mercado e para a cobertura demandada pelo produtor. É bastante importante a atenção do produtor à contratação desses mecanismos de proteção ao risco de suas atividades.

 O SENAR MINAS também vem trabalhando fortemente a assistência técnica e gerencial (ATeG) e a sucessão familiar no campo. Essas duas frentes vêm gerando grandes resultados em ganhos de produtividade, de qualidade e de aumento de renda do produtor, além da continuidade dos negócios rurais. Uma vez que os filhos entendem como gerir a propriedade, percebem que não precisam ir embora do campo. Iniciado em Minas Gerais, em 2016, o Programa de ATeG hoje atende a 11 cadeias do agronegócio, sendo a maior parte de produtores de leite e café. São quase 7 mil propriedades assistidas por uma equipe de campo de 256 técnicos e a meta é continuar crescendo.

O Programa Sucessão no Campo também começou em 2016 e é um sucesso: até hoje, já atendeu 216 famílias em 23 edições, que contam com o apoio de importantes parceiros na viabilização dos treinamentos. Temos diversos relatos de famílias que não só passaram a gerir suas fazendas com mais profissionalismo, mas que também se reaproximaram uns dos outros e voltaram a valorizar suas raízes no meio rural.

7) Qual a sua mensagem para os produtores rurais do Estado nesse momento de pandemia?

Estamos certos de que a pandemia vai passar e que os produtores rurais seguirão firmes em sua missão de produzir alimentos de qualidade, com sustentabilidade e preços competitivos. Independentemente dos novos desafios, vimos que os homens do campo não arrefeceram. Enfrentaram os obstáculos, foram eficazes em contorná-los e não pararam. Não houve desabastecimento, as exportações cresceram. É o campo, mais uma vez, segurando a economia e o país. Estão todos de parabéns por este maravilhoso trabalho.

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