*Por Marcelo Godke
As atividades bancárias estão entre as mais reguladas e vigiadas em nossa economia. Assim, (i) a instalação de dependências no exterior de instituições financeiras brasileiras, (ii) a participação societária, no País ou no exterior, de instituições financeiras brasileiras, (iii) a nomeação de administradores de instituições financeiras, (iv) a fiscalização constante das atividades desenvolvidas por instituições financeiras, (v) a forma e o conteúdo dos serviços prestados por instituições financeiras, e (vi) a manutenção de níveis mínimos de capital das instituições financeiras, dentre inúmeros outros aspectos, são objeto de detalhadas regras e constante patrulhamento por autoridades financeiras pátrias. Tal preocupação pode levar ao engessamento das atividades bancárias. Exemplo claro disso é o disposto nos artigos 18 da Lei nº 4.595/64 (“[a]s instituições financeiras somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização do Banco Central da República do Brasil ou decreto do Poder Executivo, quando forem estrangeiras”), e 52, II, e respectivo parágrafo único, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (“[a]té que sejam fixadas as condições do art. 192, são vedados: I – a instalação, no País, de novas agências de instituições financeiras domiciliadas no exterior; II – o aumento do percentual de participação, no capital de instituições financeiras com sede no País, de pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior. Parágrafo único. A vedação a que se refere este artigo não se aplica às autorizações resultantes de acordos internacionais, de reciprocidade, ou de interesse do Governo brasileiro”). Ambos dispositivos dão ao Poder Executivo a autoridade para restringir o acesso das instituições financeiras estrangeiras ao mercado doméstico. Tal atribuição de poder tem um lado positivo e um negativo. Do lado positivo, criou mercado bancário regulado, controlado e com poucos sobressaltos e problemas de falências ou liquidações forçadas de instituições financeiras. É um sistema estável e que protege os poupadores e depositantes brasileiro. Do lado negativo, cria barreira difícil de ser transposta para que instituições financeiras estrangeiras acessem o mercado doméstico, já que as decisões sobre o assunto, tomadas pela Presidência da República, são demoradas e pouco embasadas em critérios subjetivos. Além disso, impede a criação de regime de competição efetiva entre as instituições financeiras brasileiras. Por fim, leva à enorme concentração de ativos nas mãos de poucas instituições financeiras (com três conglomerados financeiros detentores de mais que 85% de todos os ativos bancários). Na prática, o que o referido Decreto fará é permitir que órgão técnico – no caso, o Banco Central do Brasil – possa, no lugar da própria Presidência da República, com rapidez e com base em critérios objetivos, permitir acesso de bancos estrangeiros ao mercado doméstico. *Marcelo Godke é sócio de Godke Advogados, mestre em direito pela Columbia Law School (EUA), mestre em direito pela Universiteit Leiden (Holanda), professor do Insper, da FAAP e do CEU Law School. |