O lucro líquido em 2019 foi de R$ 41,1 bilhões, o maior na história da companhia. O resultado foi impulsionado, principalmente, pela venda de ativos e abre dúvidas sobre a capacidade de crescimento dos resultados no futuro, segundo INEEP

A Petrobras divulgou lucro líquido de R$ 40,1 bilhões em 2019, o maior já registrado na sua história. A venda de ativos da companhia – como a Transportadora Associada de Gás (TAG), a BR Distribuidora, os campos maduros de petróleo e gás da Bacia de Campos e outros – respondeu por 62,17% (R$ 25,472 bilhões) do resultado. De acordo com o Instituto de Estudos Estratégicos do Petróleo e Gás Natural (INEEP), essa estratégia desperta dúvidas sobre a capacidade de crescimento da companhia no futuro. O estudo do INEEP aponta os principais destaques do resultado e comenta seus efeitos para o presente e futuro da companhia.

Destaques:

O resultado recorde da companhia está relacionado com 1) a agressiva venda de ativos, resultado da política de desinvestimentos; 2) a diminuição das despesas operacionais (resultado também da venda de subsidiárias, como a TAG) e menores contingências (como acordos, multas e processos judiciais); 3) o crescimento das exportações de petróleo cru, resultante do aumento de produção nos campos do pré-sal; e, 4) a expansão do fluxo de caixa livre ocasionado pela redução drástica dos investimentos;
A receita total líquida, no entanto, foi 2,6% menor à registrada no ano anterior, fechando 2019 em R$ 302,2 bilhões. Segundo a empresa, isso aconteceu em virtude: 1) redução do preço do petróleo Brent em reais; 2) menor volume produzido de derivados, que foram vendidos a preços menores aos praticados em 2018; e 3) queda de receitas das unidades do exterior, resultado da política de desinvestimentos;
No que tange aos investimentos, a redução foi de 14,8%. Dos US$ 27,4 bilhões investidos em 2019, 80% foram destinados para o setor de Exploração e Produção (E&P);
O Lucro Líquido e o EBITDA ajustado (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) foram de R$ 40,1 bilhões e R$ 129,2 bilhões, respectivamente. Em comparação ao ano anterior, o EBITDA teve um crescimento de 12,5% enquanto o Lucro Líquido cresceu 55,7%.
Com o lucro líquido de R$ 40,1 bilhões, a Petrobras obteve uma expressiva melhora nos seus resultados financeiros em 2019. Parte desse resultado positivo pode ser explicado pelo crescimento da produção de petróleo, sobretudo nos campos do pré-sal, que fizeram com que a companhia registrasse uma produção média de 2,7 milhões de barris por dia (bpd), um aumento de 6,4% em relação ao ano passado.

Esse aumento da produção ocorreu em decorrência dos novos sistemas de produção e, principalmente, devido ao ramp-up (entrada em operação) de 8 novos sistemas produtores. Por conseguinte, o aumento da produção petrolífera também impulsionou expansão das exportações, fazendo com que a receita nesse segmento saltasse dos R$ 56,1 bilhões, em 2018, para R$ 71,6 bilhões, em 2019, representando um crescimento anual de 27,6%. Esse desempenho impactou diretamente os resultados financeiros do setor de Exploração e Produção (E&P), que obteve um crescimento de 12,9% em 2019, ao auferir um lucro operacional de R$ 75 bilhões.

Refino sofre queda em receitas operacionais

Já o setor de Refino registrou queda em suas receitas operacionais, encerrando 2019 com lucro operacional 39,5% inferior ao registrado em 2018, que foi de R$ 6,4 bilhões. Esse resultado está associado tanto com a diminuição na produção de derivados em 2,5%, assim como na redução das receitas líquidas dos derivados para o mercado interno, uma queda de 4,5% quando comparado ao ano anterior. Esse resultado negativo foi puxado especialmente pela queda de vendas na gasolina, óleo combustível e nafta, que só em 2019 registraram uma retração de, respectivamente, 9,4%, 11,1% e 27,0%.

Vale ressaltar que essa queda acontece em um contexto no qual o mercado brasileiro de derivados registrou crescimento de 2,9%. Isso evidencia, portanto, a redução do market share da Petrobrás no setor, fruto de sua política de preços alinhada com preço internacional (PPI) que favorece a entrada de importadores e, ao mesmo tempo, mantém preços elevados para os consumidores. Esta é uma situação que pode se agravar ainda mais com a decisão da Petrobras em vender 50% do seu parque de refino, o que, pelas características da infraestrutura petrolífera do Brasil, tenderá a criar monopólios privados regionais de derivados capazes de determinar localmente preços superiores aos atuais.

O crescimento do lucro operacional do E&P e a retração no setor de Refino são reflexos da política de desinvestimentos da companhia, cuja estratégia consiste em desfazer os ativos do downstream (refino, transporte, distribuição etc) para se dedicar quase exclusivamente nas atividades upstream (exploração e produção). Aliás, grande parte do resultado financeiro do ano está relacionado com a venda dos ativos da companhia – à exemplo da TAG, da BR Distribuidora, da refinaria de Pasadena, do centro de distribuição do Paraguai, além de campos em águas rasas, nas Bacias de Campos e Santos, entre outros. Somente com essas vendas, a Petrobrás conseguiu em um ano levantar R$ 41 bilhões.

Consequentemente, outro fator que merece atenção no aumento recente do caixa financeiro da companhia em 2019 é a significativa redução nas suas despesas operacionais. Com os custos de operação 29,6% menores aos registrados em 2018, a grande redução dessas despesas ocorreu em virtude do ganho com venda de ativos, muito embora no último trimestre ela tenha obtido um aumento significativo em decorrência de despesas exploratórias para a extração de óleo e gás.

Endividamento no limite

Um fenômeno parecido ao que tem ocorrido nos índices de endividamento da companhia. Em 2019, o endividamento líquido da companhia apresentou crescimento de 4,6%. Dessa forma, o índice relação dívida líquida / EBITDA ajustado subiu de 2,34, em 2018, para 2,460, em 2019. Segundo a Petrobras, essa alavancagem da dívida ocorreu devido ao uso de recursos para pagamento de bônus referente ao leilão do excedente da Cessão Onerosa.

“A estratégia de desinvestimento como forma de reduzir tanto o endividamento da companhia como seus custos operacionais parece ter encontrado os seus limites. Embora essa política represente uma expressiva geração imediata de receita, esse movimento é incapaz de manter a geração de caixa operacional sem que se aumente os gastos com investimentos.Tendo em vista que a atual gestão da Petrobrás, além de vender ativos, concentra a sua carteira de investimentos quase exclusivamente no E&P, esse movimento corre um risco ainda mais grave de tornar as receitas da empresa mais suscetíveis às oscilações internacionais do petróleo. Uma vez que a companhia está se desfazendo de seus ativos downstream que, como acontece com as refinarias, são aqueles capazes de gerar resultado mesmo no ciclo de baixa do barril do petróleo”, afirmou Rodrigo Leão, coordenador do INEEP.

Leão ainda afirma que parte da dívida tem sido quitada por meio da geração de receitas operacionais – o que comprova, na prática, que a Petrobras tem plenas condições de recuperar sua saúde financeira sem a necessidade de vender ativos. “O recente aumento da dívida líquida é um claro sinal de que, cedo ou tarde, a companhia precisará de recursos para investir em novos projetos, o que poderá não ser possível no longo prazo caso a empresa continue a se desintegrar por meio da venda de suas subsidiárias”, concluiu.

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